sábado, 3 de setembro de 2011

Uma vida sem sentido.


Já era madrugada quando ele parou seu carro em frente àquele boteco de esquina.
Não era um barzinho badalado cheio de gente bacana. Era um daqueles lugares degradantes onde se reúnem aqueles que foram excluídos pela escória da própria escória. O tipico lugar onde os perdedores se encontram. Prostitutas feias, jogadores que perderam tudo, assassinos desempregados, ex policiais abandonados pela família, viciados sem dinheiro e ladrões de pouca sorte.
Sentou-se diante de uma mesa vazia e suja, como sua vida. Procurou um canto mais discreto para não ver nem ser visto.
Um garçom que parecia um retrato 3x4 da miséria, vestindo um avental encardido, lhe trouxe uma bebida gelada. Ele recusou e pediu algo mais forte. Pagou adiantado e pediu que lhe deixasse a garrafa.
E por ali ficou, queimando sua alma a cada trago. E de trago em trago foi perdendo os sentidos.
Despertou quando ela chegou.
Ela chegou já tarde. Vestia um vestido azul, de cetim barato, bonito sobre sua pele alva. O cabelo solto lhe caia sobre  os olhos ocultando o borrão da maquiagem que lhe denunciava o choro de minutos atras.
Sentou-se ao lado dele, e ali se aninhou. Não disse nada. Ele também permaneceu mudo, indiferente à presença dela.
Ela então acariciou-lhe a nuca. O toque leve de sua mão pelos pontos secretos não passaram desapercebido por ele. Mesmo que quisesse, não poderia ficar indiferente àquelas carícias. Passou os braços por aquele corpo pequeno e frágil, abraçando-a meio desajeitado na cadeira dura de boteco.
Ela então sentiu em seus dedos uma nova cicatriz em seu rosto. Virou-se para ele e perguntou:
- O que foi isso?
- Andei brigando.
- Você brigou?
- É... tenho brigado demais. Bebido demais. Morrendo um pouco a cada dia.
- E pra que isso?
- Não sei mais se quero continuar vivendo.
- Você devia ir à igreja.
- Minha alma não tem mais salvação.
- Fala assim não.
- Verdade...
- Você devia aceitar jesus.
- E se ele não me aceitar?
- Ele aceita todo mundo. Basta se arrepender.
- Mas não me arrependo de nada do que fiz. Só me arrependo de ter deixado você ter ido embora.
- Eu tinha que ir. Você sabe disso. Eu tinha que encontrar meu pai.
- E encontrou?
- Encontrei... Meu pai tá morto. Deu um tiro no ouvido. - ela já falava com a voz embaçada pelo choro que vinha.
- Eu sinto muito - disse abraçando-a mais forte.
Ficaram unidos assim por muito tempo, até que o choro parou.
- Me perdoa? - ela disse.
- Pelo quê?
- Por te encher com meus problemas.
- Queria que fizesse isso sempre. Queria você comigo para sempre.
- Para sempre é muita coisa.
- Com você parece que passa tão rápído. Acho que se você voltasse para mim, a morte então me encontraria. Gente como eu, não pode ser feliz.
- ... Mas eu vim para ficar - ela disse olhando no fundo dos olhos dele.
- Jura? - perguntou quase que sussurrando, mas ela não escutou.
- Me abraça?
Ele então a abraçou com uma ternura que desconhecia ter.
E abraçados permaneceram.
O dia quase raiava quando o garçon chegou na mesa do canto e o encontrou debruçado entre um copo vazio e uma garrafa quase no fim. Tocou-lhe o ombro para desperta-lo.
Ele acordou assutado. A procurou com o olhar perdido, e viu que estava sozinho.
O sol já clareava o dia. Mais um maldito dia de setembro.
Correu para o carro. Se jogou sobre o banco, batendo a porta com força. Girou a chave e acelerou.
O ronco do motor não abafou o grito de desespero que vinha do fundo de sua alma. Mas ninguém ouviu. Porque o seu sofrimento, para o mundo em toda a sua grandiosidade, não era nada. Para o mundo ao seu redor, sua dor não significava nada.
E acelerou fundo pela estrada, sem rumo, sem destino, sem esperança... como sua própria vida.

Um comentário:

Anônimo disse...

Fica assim não. Me senti muito mal ao ler isso. A gente ainda vai se encontrar. Em breve, espero.
Espero te ver bem. Beijos