quarta-feira, 9 de maio de 2012

Sombras em minha vida


Da minha janela eu acompanhava a sombra do prédio de escritórios onde trabalho que se projetava no telhado de uma casa bem diante da janela do meu escritório.
Era uma sombra definida, com linhas retas e bem traçadas que coincidentemente acompanha as fileiras de telhas conforme se movia no decorrer do dia. O dia passava lento e a sombra se movia exata, perfeita, simétrica às linhas das telhas. E eu de minha janela ficava facinado com a desenvoltura de seu caminhar pelo telhado, quase desfilando. Entre um telefonema e outro, um atendimento ou a execução de um serviço qualquer, eu estava sempre acompanhando aquela sombra.
Com o tempo eu dispensava até o relógio. Sabia que quando a sombra chegava na vigésima sétima fileira era a hora do cafezinho. Quando chegava na segunda fileira superior já era hora de sair.
Sem perceber eu me afeiçoava àquela sombra.
Sentia tristeza nos dias nublados, que me impediam de vê-la

Certo dia, a sombra ficou diferente. A linha reta foi maculada por alguma coisa que projetava uma barriga na minha sombra preferida. Era uma barriga enorme, feia. E eu, da minha janela, já sabia aqui comigo que sombras não ficam grávidas.
Durante toda a semana minha sombra estava ali, violada, indefinida. E no decorrer daquela semana aquilo me incomodava a ponto de fechar as persianas para não ter que ver aquela abominação do que outrora foi perfeito.
Logo descobri que aquela barriga era causada por uma antena instalada no alto do prédio.
Uma antena tipo parabólica, arredondada, que no local que se encontrava instalada danificou minha sombra completamente.
Conversei com o responsável pela manutenção e ele me disse que a antena havia sido instalada a pedido dos escritorios que possuiam aparelhos de televisão e queriam melhor imagens em suas transmissões.
Mas e minha sombra? Como ficaria?
Inicialmente comecei um abaixo assinado para retirar a antena de televisão. Mas ninguém si dignou em assinar. Então, fiz uma reclamação formal à empresa que geria o prédio. Mas também fui ignorado.
Depois de algumas semanas, sem sucesso na retirada da antena de forma pacífica, eu resolvi apelar para meios mais drásticos.
Subi ao terraço munido de um machado que retirei do painel de controle de incêndios e retirei a antena por conta própria.
Lá de cima, eu a vi cair sobre alguns carros. Uns dois ou tres eu acho. Mas meu olhar tinha outra direção a buscar. Foi então que eu a vi novamente ali. Linda, perfeita e reta. A minha amada sombra diária.
Mas eu a vi por pouco tempo ate ser contido pelos seguranças e policiais que me conduziram para a delegacia.
Fui julgado.
Condenado.
E aqui estou a me apaixonar por essa nova sombra listrada que se projeta da janela de minha cela.

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