terça-feira, 20 de março de 2012

Uma janela do centro

Passando por uma rua do centro velho da cidade, paro no crusamento para atrevessá-lo, quando olho para cima e algo bem comum me chama a atenção.
Uma janela de um pequeno apartamento de um velho prédio que como tantos caía aos pedaços. O apartamento fica sobre uma loja cuja fachada nobre e moderna esconde dos olhares dos transeuntes mais desapercebidos o estado real daquele imovel.
Mas eu estou olhando para cima. E acima da fachada da loja eu vejo aquela janela suja, de madeira, que a pintura descascada em meio ao mofo e a umidade não me permitem identificar a cor.
No parapeito da janela há uma coleção de bonsais, que de tão abandonados mais parecem arbustos em pequenos vasos.
Pendurado à janela balança um "mensageiro do vento", feito com bambu, presente de um dos muitos amigos queridos em um dos vários momentos especiais de sua vida.
Daquele lugar da calçada não vejo muita coisa daquilo que seria o seu quarto.
Então ele surge na janela.
Seu nome é Marcos. Mas adora ser chamado de Markinhus.
São dez e meia da manhã e aparentemente ele acaba de acordar.
Está sem camisa, expondo seu fisico magérrimo. Leva pendurado no pescoço uma correntinha de prata com um desproporcional coração escarlate de plastico, enquanto sua mão esquerda segura uma escova.
Olha descontraidamente para a cidade embalada no frenesi diário do pré rush, e enquanto escova sua franja alaranjada que cai obstruindo a visão de um des seus olhos, ele faz uma expressão delicada com o rosto, quase cômica, como se nada do que está acontecendo ali tivesse haver com sua pessoa.
Está alheio a tudo aquilo.
Markinhus se sente bem. Sente-se muito feliz sem motivo algum. Apenas decidiu que hoje é um dia bom para estar feliz.
Trabalha em uma loja de departamento naquele mesmo centro imundo no qual mora. Sabe que está atrasado. Sabe que deveria ter entrado na empresa há mais de uma hora. Mas não está preocupado.
Hoje é um dia perfeito para se estar feliz.
Começa a se requebrar, provavelmente escutando alguma música a qual não ouço, impedido pelo barulho do tráfego. Mas imagino que seja uma balada pop internacional dançante, pelo modo com o qual move seu corpo.
Definitivamente Markinhus decidiu que hoje está feliz.
O sinal abre...
Volto a minha realidade...
Atravesso a rua e sigo meu caminho após aquele instante tão trivial.
No meu caso, ainda não aprendi a definir quando serão meus momentos de felicidade.

Nenhum comentário: