quinta-feira, 22 de março de 2012

Canto de Dor


Tinha tanta coisa para escrever...
Então no interior solitário do carro na noite de chuva, regressando para uma casa vazia eu a ouvi...
Minhas palavras já haviam sido usadas com maestria, cantadas em outro idioma.
Perfeito!

terça-feira, 20 de março de 2012

Uma janela do centro

Passando por uma rua do centro velho da cidade, paro no crusamento para atrevessá-lo, quando olho para cima e algo bem comum me chama a atenção.
Uma janela de um pequeno apartamento de um velho prédio que como tantos caía aos pedaços. O apartamento fica sobre uma loja cuja fachada nobre e moderna esconde dos olhares dos transeuntes mais desapercebidos o estado real daquele imovel.
Mas eu estou olhando para cima. E acima da fachada da loja eu vejo aquela janela suja, de madeira, que a pintura descascada em meio ao mofo e a umidade não me permitem identificar a cor.
No parapeito da janela há uma coleção de bonsais, que de tão abandonados mais parecem arbustos em pequenos vasos.
Pendurado à janela balança um "mensageiro do vento", feito com bambu, presente de um dos muitos amigos queridos em um dos vários momentos especiais de sua vida.
Daquele lugar da calçada não vejo muita coisa daquilo que seria o seu quarto.
Então ele surge na janela.
Seu nome é Marcos. Mas adora ser chamado de Markinhus.
São dez e meia da manhã e aparentemente ele acaba de acordar.
Está sem camisa, expondo seu fisico magérrimo. Leva pendurado no pescoço uma correntinha de prata com um desproporcional coração escarlate de plastico, enquanto sua mão esquerda segura uma escova.
Olha descontraidamente para a cidade embalada no frenesi diário do pré rush, e enquanto escova sua franja alaranjada que cai obstruindo a visão de um des seus olhos, ele faz uma expressão delicada com o rosto, quase cômica, como se nada do que está acontecendo ali tivesse haver com sua pessoa.
Está alheio a tudo aquilo.
Markinhus se sente bem. Sente-se muito feliz sem motivo algum. Apenas decidiu que hoje é um dia bom para estar feliz.
Trabalha em uma loja de departamento naquele mesmo centro imundo no qual mora. Sabe que está atrasado. Sabe que deveria ter entrado na empresa há mais de uma hora. Mas não está preocupado.
Hoje é um dia perfeito para se estar feliz.
Começa a se requebrar, provavelmente escutando alguma música a qual não ouço, impedido pelo barulho do tráfego. Mas imagino que seja uma balada pop internacional dançante, pelo modo com o qual move seu corpo.
Definitivamente Markinhus decidiu que hoje está feliz.
O sinal abre...
Volto a minha realidade...
Atravesso a rua e sigo meu caminho após aquele instante tão trivial.
No meu caso, ainda não aprendi a definir quando serão meus momentos de felicidade.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Quando cai a noite

Existe uma hora crítica
É quando cai a noite...
Quando o sol se recolhe.
As estrelas começam a acender ao céu. Todas com seu brilho ensinuante, sedutor, impuro... enfim, efêmeras.
A lua, com seu brilho tolo que mal consegue iluminar os olhares perdidos na escuridão.
Nesta hora, quando a noite chega, o mundo naturalmente se silencia, e as lembranças nos atingem em cheio.
É quando a noite cai que é mais dificil suportar todos os sentidos e sentimentos.
Quando a noite cai, a gente despenca.
...

domingo, 4 de março de 2012

Ao abrir uma gaveta

Hoje eu abri uma gaveta esquecida de um velho guarda roupa.
E junto com aquele cheiro de guardado chegaram as lembranças.
Encontrei algumas cartas, algumas fotos, alguns objetos dos quais nem me lembrava mais.
Encontrei também uma velha coleção de HQ japoneses.
Lembrei de quando minha vida era como um mangá. Que se começa a ler de tras para frente, meio complicado, com a sequencia lógica de quem não se preocupa muito com a lógica, e está sempre fazendo sua própria sequência.
De quando eu ficava pequeno perto da garota que eu gostava, ou quando em desespero abria minha boca como se fosse engolir o mundo em um grito incontível.
De quando meu tamanho se agigantava diante de uma vitória gloriosa sobre questões simples do dia a dia.
De quando a vida era colorida à cores fortes e vibrantes.
De quando me sentia como um herói em defesa da garota de roupas curtas e com cara de garotinha indefesa.
De quando eu ouvia o meu nome gritado por um bando de gente que torcia por mim.
Acho que está na hora de fechar gavetas e voltar a escrever a minha história.
Colocar um pouco mais de cores, emoções... sei lá, talvez mudar o enredo, criar novos personagens.
Como diria um velho amigo meu: "O importante é escrever. Escreva abobrinhas, repolhos e beterrabas. Escreva a todo o instante. Escreva e você se sentirá vivo... Até mesmo após a a sua morte."

Sonhos...

Pensei que algumas lembranças não me trariam mais transtornos, mas por incrível que pareça ontem acordei após um sonho bom, e me senti muito mal.
Descobri que os sonhos bons são piores que pesadelos.
Estamos fadados a acordar depois de qualquer sonho. Porém, enquanto depois de um pesadelo ficamos felizes que tenha sido só um sonho, após um sonho bom, vem a frustração ante uma realidade tão mediocre.
Ontem após um sonho bom, eu perdi meu sono. Perdi a fé no dia que chegava. Perdi minha instável tranquilidade aparente. Acho que ainda não perdi a esperança, mas a vejo fraquejar a cada dia mais um pouco. Parece que são dias difíceis, com poucas vitórias para estimular as lutas.
Interessante, que até ontem eu fechava os olhos e não conseguia mais me lembrar de algumas coisas, alguns instantes, momentos, sentidos e sentimentos. Mas o maldito sonho fez com que tudo se aflorasse. Gritante. Dolorosamente. Impiedosamente.
Sinto-me incapaz de entender muitas coisas, outras nunca me chamaram a atenção.
Sempre ouvi dizer que a beleza do Mistério está justamente no Desconhecido.
Sinto-me fraco...
... Mas sei que não posso parar ainda.